Dia 13 de maio, começava o caminho para Santiago do Cacém, ponto de partida de nossas pedaladas até Lagos pela Rota Vicentina, nome vindo de São Vicente, que teve seus restos mortais transportados de Sagres para Lisboa. Para quem gosta de uma boa lenda, busque a história de São Vicente. É muito interessante. 

Santiago do Cacém. Vista noite do quarto do hotel Octant

Chegando na cidade nos hospedamos no Hotel Octant. Moderno, charmoso, muito bem decorado e com uma vista muito linda da parte histórica da cidade. O restaurante deles também é ótimo e nos atenderam apesar de já estar quase encerrando o almoço. (Vinho: Herdade do Cebolal, branco) Abastecidos e agradecidos aos deuses pela maravilhosa refeição e pelo bom vinho, fomos ao get lost. Tentar visitar museus, igrejas, castelos e monumentos às segundas-feiras, é perda de tempo. Tudo fechado. É quase unânime nas cidades de quase todos os tamanhos. Porém, você pode dar a sorte de encontrar a professora Esperança. Uma portuguesa de seus 60 anos aproximadamente que estava caminhando com seu cachorro e vinha cantarolando uma canção sobre o  “mar salgado”  quando a interrompemos curiosos sobre a música e ela nos demonstrou amar sua profissão de professora e no contou sobre um evento poético histórico que estava promovendo na escola onde leciona e nos presenteou com declamações inflamadas de “O Mostrengo” de Fernando Pessoa. Essas coisas que só as viagens nos trazem.  Que encontro feliz. 

Seguindo em frente, voltamos ao hotel onde a turma da Top Bike Portugal já estava se instalando. Nossos guias Telmo e João apresentaram as bikes aos companheiros de viagem porque as nossas, nós carregamos conosco o tempo todo, e, nos foi apresentado o briefing da rota que começaríamos no dia seguinte. Jantamos todos juntos no hotel. 

Esq/Dir – Edson, Jussara, Tim, Debie, Ana Maria, Christine, Melanie

Dia 14 de maio, iniciamos o pedal. A primeira noite seria em Vila Nova de Mil Fontes. No caminho encontramos a placa onde iniciamos esse roteiro usando trilhas diferentes em 2017 com mais 3 amigos do coração. O saudoso Ivo, o Nilton e a Simone.

O feno já embalado. Uma cena comum nas fazendas por onde passamos

Apesar de Lagos ser o mesmo destino final agora, a cada etapa os caminhos foram diferentes, o que transformou a jornada em outra viagem. Nova, com novas surpresas e belezas. Passamos por Porto Covo. Uma graça de lugar com uma costa linda e que para a nossa sorte, ainda não seria a mais linda do caminho. Aliás, muito difícil eleger a mais bonita. Nessa parada, almoçamos e seguimos pela costa um bom tempo em caminhos de terra, nossos preferidos.

Passamos por várias fazendas com seus rolos de feno prontos para embarque. As tradicionais casas brancas com batentes e molduras amarelas, azuis, vermelhas, lindas, da região do Alentejo e Algarve. Uma coisa muito gostosa, pelo menos nós gostamos, é o perfume que exala dessa vegetação que dá essa linda flor da foto ao lado. É muito especial para a gente pois traz lembranças de uma outra viagem por aqui e é a marca desse caminho. Sua folhas são bastante oleosas. Seu nome na região é Esteva, mas tem diferentes nomes, dependendo de onde se esteja. O nome científico é Cistus ladanifer. Uma coisa bem divertida também foram os trechos com muita areia onde várias vezes tivemos que empurrar as bicicletas. Derrapa pra lá, derrapa pra cá até… até…, cair. Tombo bobo, na areia fofa, mas pode ralar o joelho. Na verdade, são conhecidos universalmente, dois tipos de ciclistas: aquele que já caiu e aquele que vai cair.

A chegada a Vila Nova de Mil Fontes foi bem especial e com uma boa dose de emoção ao lembramos dos amigos com quem pedalamos em 2017, Simone, Nilton e em especial do Ivo que, nos seus 70 anos, pedalava melhor que todos nós, mas partiu depois de algum tempo em razão de um câncer deixando saudades e boas lembranças.

Ficamos no HS Milfontes Beach Hotel com uma vista incrível para a foz do Rio Mira. No bar do hotel tomamos um delicioso porto tônica e depois, corajosamente, demos um mergulho no rio, gelado, mas muito gostoso pois ao sair da água, o sol forte nos revigorou com um calorzinho especial. Aproveitamos a jacuzzi do nosso quarto, relaxamos e fomos jantar com a turma toda na Tasca do Celso, delicioso. (Vinho: Vicentino Syrah 2019 – Vinhos da Costa Atlântica)

De Vila Nova de Mil Fontes, no dia 15, fomos até Zambujeira do Mar. No nosso hotel em Mil Fontes estavam também hospedados muitos ciclistas e também vários da turma do trekking. Aliás tinha muita gente caminhando pela Rota Vicentina. Nos lembrou o Caminho de Santiago Português pela costa que fizemos em 2023. Na primeira parada para o café, xixi e etc., encontramos vários grupos de bike. Foi em Longueira, em torno de um moinho de vento. Continuando, passamos por Almograve e que está construindo uma ciclovia. Cada vez mais as cidades portuguesas oferecem melhores condições para os ciclistas, entendendo que isso aumenta a circulação de turistas que trazem mais movimento financeiro para o comércio, hotelaria e restaurantes, bares, etc. Chegamos à praia de Odemira e demos uma paradinha para apreciar a paisagem em um miradouro (mirante em português do Brasil). Pedalamos mais um pouco até o Farol de Cabo Sardão em São Teotónio. Além da paisagem linda, uma das coisas que nos impressionou foram os ninhos de cegonha na beira das pedras, das falésias, dos penhascos, contrariando todo o bom senso porque os ventos fortíssimos poderiam derrubar tudo. Segundo informações que lemos, este local é o único conhecido do mundo onde a chamada cegonha-branca constrói seu ninho. 

Chegamos no local onde passaríamos aquela noite, Herdade do Touril. Como estava na hora do almoço, apenas deixamos as coisas e fomos ao restaurante em Zambujeira do Mar. Fomos todos juntos na van. Só o Tim que resolveu ir a pé e acabou por se perder, chegando bem atrasado na cidade. Comemos apenas uma salada pois tínhamos reservado o jantar na pousada, onde teríamos uma surpresa da Top Bike Tours. E foi linda a surpresa. Após o jantar, um show de fado nos fez sentir Portugal mais intensamente ainda.  (Vinho Herdade do Sobroso – Tinto) Acordamos abençoados pela natureza com um lindo arco-íris. A Herdade do Touril é absolutamente linda. Um espaço de paz e tranquilidade, com um conforto e charme especiais

Pousada Rural Herdade do Touril

Terceiro dia de pedal, dia 16, foi de Zambujeira do Mar até Aljezur. Logo no início da pedalada, saindo de Zambujeira do Mar, uma subida de “respeito” exigiu bastante esforço dos que estavam de bike normal. Nós e o Tim. As outras meninas estavam de e-bike e foi mole pra elas. Depois do “ladeirão” fomos recompensados na visita a uma plantação de framboesas e pudemos pegar algumas caídas e prova-las. Maravilhosas. Muitas frutas vermelhas nessa região. Em seguida, mais uma subida, parece que o dia seria de pedal forte pelo jeito. No meio dessa subida, de repente, parecia que estávamos em um zoológico. Soltos em um mesmo espaço cercado, vimos zebras, búfalos, avestruzes e até lhamas. Lhamas? Meio fora do lugar, não é? Foi bem interessante. Estávamos então já na região de São Teotónio. Ganhamos mais uma surpresa em Brejão que foi a visita à casa de Amália Rodrigues, falecida em 1999 aos 79 anos, a rainha do fado, conhecida internacionalmente, grande divulgadora da música portuguesa pelo mundo. A casa, maravilhosa por sinal, tem até uma praia particular, a Praia de Amália. Seguindo, mais subidas e claro mais descidas que são tão difíceis quanto. Chegamos a Odeceixe e fomos visitar uma destilaria de uma aguardente muito apreciada, medronho. Medronho é o nome de um fruto que também pode ser comido. O local se chama Junior Jacques Destiladores que produz um aguardente de alta qualidade, produtos embalados com muito charme e elegância. De toda a história sobre o processo de destilação e outras, ficou muito marcada a história do incêndio que ocorreu ano passado, 2023, e que destruiu toda a produção daquele ano. Muito triste. Mais triste ainda saber que não foi fogo natural que às vezes acontece na natureza e sim a irresponsabilidade de algumas pessoas. Nem queremos contar o caso pois revolta. Almoçamos em Odeceixe, local de divisa entre Alentejo e Algarve. A caminho de Aljezur, um pouquinho antes de chegar, paramos na Pousada Turismo Rural João Roupeiro que fica entre Odeceixe e Maria Vinagre onde iríamos dormir. Foram 35km de pedal. Não foi muito, mas as subidas exigiram bastante. Deixamos as coisas na pousada e fomos fazer uma degustação na Vinícola Vicentino onde experimentamos muito vinho, acompanhados por queijos, frutas secas, presunto Parma e torradas. Todos ficamos muito “felizes” com a experiência, garantia de uma boa noite de sono. Foi um dia maravilhoso. 

Dia 17 de maio, o pedal seria da pousada João Roupeiro até Pedralva, mas iríamos fazer uma visita ao Castelo de Aljezur que fica láááá no alto do morro, como todos os castelos aliás. Subida muito íngreme. Dá-lhe pernas e fôlego. Lá de cima, uma vista maravilhosa. Seguindo o caminho, o destino seria a praia de Monte Clérico, onde fizemos mais uma parada para abastecer o estômago e se maravilhar com as paisagens absurdamente lindas da Costa Vicentina. Só que a alegria durou pouco. Mais uma super subida e sua natural descida nos esperavam chegar à praia de Arrifama que descobrimos é excelente para o surf. Tinha muito surfista na água. 

Saindo de Arrifama, pedalamos por uma estrada de asfalto compartilhada entre bikes e carros, uma chamada ecovia, que estampa no asfalto, bem grande, o desenho de uma bike, indicando que a via é compartilhada e a bicicleta merece o mesmo respeito de um carro à sua frente, portanto você não tem que dar passagem, mas o faz por cortesia quase sempre, pedalando mais próximo da sua direita. Infelizmente uma das nossas companheiras de pedal, nesse excesso de gentileza, acabou indo muito à direita, desequilibrou-se e caiu na canaleta, nos dando um grande susto. Felizmente nada aconteceu. Apenas uns momentos de tensão e nada mais. De qualquer forma isso nos tirou uma hora de tempo pois tivemos que esperar um resgate da van. Ela estava um pouco assustada e não queria continuar pedalando aquele dia. Tudo certo, seguimos, atravessando uma serra linda de pequenos “sobes e desces” até Carrapateira, onde almoçamos já bastante tarde em um restaurante “naturéba”. O Alecrim. Excelente comida. Energias repostas entramos por uma pitoresca estradinha a caminho de Pedralva. Essa vila é um caso à parte. Em primeiro lugar por nos trazer de volta as lembranças de 2017 quando também ficamos em Pedral com Ivo, Simone e Nilton. Reencontramos o pequeno riacho que atravessa a estrada, mas que ninguém quis arriscar ir de bike. Usamos a pequena ponte ao lado tudo certo. Nossas lembranças até então, além do pitoresco da vila era o local onde lavamos nossas bikes, a nossa casinha, de nome Castelejo, o relógio da recepção que gira ao contrário com se quisesse parar o tempo andando para trás. Pedralva é única e merece ser destacada. Durante muitos anos foi uma aldeia de vocação agrícola e que entrou em processo de despovoamento. Em 2006 era um conjunto de ruínas com 9 habitantes. Saiba mais nesse link. https://www.aldeiadapedralva.com/aldeia-reconstruida

Chegamos, lavamos as bikes, nos lavamos também e fomos jantar uma sopa, um queijo Brie ao forno com mel e shimeji refogado. (Vinho: Arvad tinto do Algarve) Uma excelente noite de sono após tanto pedal, tanta natureza e muitas emoções. Pequeno almoço e, seguimos em direção a Sagres. De cara, para começar o dia, uma subida forte até pegar o asfalto em direção à Vila do Bispo, nossa primeira parada para cafezinho. Uma vila muito bonitinha. Tomamos a costa novamente com paisagens maravilhosas, sempre, e o destino era Cabo de São Vicente, ponto extremo a sudoeste da Europa. Infelizmente o farol estava fechado. Não pudemos visitar seu interior porque estão em obras de manutenção, preparando-se para a altíssima estação. O Verão. Uma pena. Ele é um dos mais potentes da Europa. Sua luz pode ser vista a 100km. Almoçamos no restaurante São Vicente, com vista do farol ao fundo, bem turístico, por isso nada a comentar. Seguimos para Sagres e visitamos o Forte da Escola Naval de Sagres. Ali se preparou a grande empreitada portuguesa na exploração de novas rotas marítimas por inciativa do Infante D. Henrique. Demos uma volta completa em toda a área e nos divertimos muito. É um lindo passeio. Nos hospedamos no Hotel Memmo Baleeira. Muito confortável, muito bem localizado. Fomos ao bar, pedimos Aperol Spritz e nos deliciamos com aquela vista especial. Fizemos um “get lost” pelo hotel, descemos até a pequena praia, demos uma bela caminhada e na volta nos sentamos para dar uma descansada e esperar a hora do jantar. Fomos a um lugar bem próximo onde nos disseram que serviam um bom peixe. Restaurante Gigi. Nada especial, mas valeu. (Vinho: Villa Alvor, tinto. Algarve) 

Dia 19 de maio, domingão, nossa última etapa do passeio estava começando. O destino: Lagos, quase 40km de pedal. Tínhamos que voltar um pouquinho até Vila do Bispo para então seguir até Raposeira, onde encontramos tudo fechado. Demos uma paradinha apenas para uma fruta, um banheiro, uma água. Então tomamos o caminho de Salema, uma linda praia e lá deu para tomar um café e comer um pastel de nata. Saindo de Salema, logo de cara no topo, tínhamos que enfrentar uma descida de 20% de inclinação. Haja mão, haja freio, haja tensão. O caminho era até Budens e fomos até a praia de Burgau que está ao pé do morro ou seja terminou a rua, começou a areia.  Aliás, a vila é toda no sobe e desce, sobe e desce. O sol estava pegando forte, então, na paradinha a opção foi uma cerveja gelada que caiu como um néctar dos deuses. Bora pedalar em direção à praia da Luz que é bem diferente do que estávamos vendo até então. Lindos e luxuosos condomínios, mas a praia não tem quase areia. É muita pedra, porém não impede que as pessoas curtam um sol e um banho bem fresquinho no mar. Ok. Um banho bem frio. Também foi enorme a quantidade de pessoas fazendo trekking nesse trecho. Se você não é da bike, é uma opção bem interessante, caminhar pela Costa Vicentina. Você vai se encantar, se maravilhar melhor dizendo, com a natureza do lugar. Nosso almoço foi aí, no Restaurante Ben&Jerry. Abastecidos, não querendo que terminasse a linda viagem, seguimos para a o último trecho de nosso passeio. Lagos nos esperava e também a surpresa de saber que  iríamos ficar no mesmo hotel em que ficamos em 2017, com nossos amigos. Hotel Tivoli de Lagos é muito bom e bem labiríntico. Precisa-se de mapa ou um guia pra achar o quarto. Aguardamos nossa vez e nos levaram até o apartamento. Agradável, confortável. Após o merecido banho fomos dar uma passeio pelo centro histórico da cidade, passando pelo Mercado Municipal (1924), praça Rei D. Sebastião, como muitas cidades históricas, Lagos também foi uma cidade muralhada e resolvemos dar a volta às muralhas até retornar ao centro. O grupo combinou o jantar às 19:30 e não sabíamos onde iríamos pois a reserva foi feita pelo pessoal da Topbike Tours Portugal. Coincidência feliz, Adega da Marina, o mesmo restaurante que fomos no dia 25 de Abril almoçar quando estávamos em Portimão. Turisticão, mas delicioso. Mencionamos a data porque o 25 de Abril de 1974, é uma das datas mais importantes de Portugal pois foi quando deram um fim aos 40 anos de ditadura altamente opressora. A Revolução dos Cravos.  Se você se interessa por história, segue um vídeo com uma breve explicação desse acontecimento muito importante para o país. https://www.youtube.com/watch?v=55afPNppzTk

(Vinho, verde Muralhas de Monção da região do Minho)

Após o jantar voltamos ao hotel e o nosso guia, Telmo, fez um vídeo de toda nossa jornada e ficou muito divertido. Brindamos com vinho do Porto aos amigos, à vida, à sorte de termos tido mais essa grande oportunidade de viajar por terras tão lindas, com pessoas especiais. 

Voltamos a Santiago do Cacém ponto de partida do passeio, pegamos nosso carro e seguimos para Sesimbra, nossa casa até o dia 11 de junho.